sábado, 29 de dezembro de 2007

Trauma (parte II)

São Paulo, 1990. Tia Paula, então com doze anos, freqüentava a sexta série de um colégio público na Vila Mariana. Aula de Português.
A professora se chamava Priscila. Não sei dizer a idade dela, pois aos doze anos todo mundo é velho, mas me lembro que ela loira, cabelo curto, eternamente emburrada. E era a única professora do colégio que usava avental. Até aquela fatídica aula de redação nós nunca tínhamos tido motivos para ter medo da Priscila, apesar da cara de má. Ela entrava na sala, fazia seu trabalho sem dar muita bola para a gente e saía. Até aquela fatídica aula.
A tarefa era fazer uma redação sobre desmatamento. Eu, que sempre fui metida a escrever, tive uma idéia, para mim, genial. Fiz um diálogo entre os bichos da floresta discutindo os efeitos do desmatamento na vida deles. Onça, tatu, papagaio, tinha tudo. Fiquei orgulhosíssima do meu texto, todo mundo ia adorar, imaginem, bichos conversando! Entreguei a redação saltitando, e mal podia esperar pela aula seguinte, quando eu certamente receberia os efusivos parabéns da professora e os comentários admirados dos meus colegas. E a aula seguinte veio.
Parece mentira, mas minha redação era a última da pilha. A professora ia chamando nome por nome e eu ia ficando cada vez mais ansiosa. Será que eu tinha tirado um A? A não, vá, Paula, um pouco de modéstia agora, um B+ talvez. Quando chegou minha vez, Priscila pegou a folha pela pontinha como quem pega um treco sujo do chão e começou a balançar na minha frente:
_ Paula, que idéia foi essa? Eu tinha pedido uma dissertação! Você sabe o que é isso? Não sabe, né? Se soubesse não tinha feito isso aqui. Tenha dó, você não presta atenção no que eu digo, não? Quem mandou fazer narrativa? Isso não tem nada a ver com o que eu pedi!
Ela estava realmente brava enquanto falava. Eu, por minha vez, já não estava lá. Tinha sumido de vergonha, de ódio da Priscila por chamar meu texto de “isso”. E na frente da classe inteira. E essa foi apenas uma das inúmeras vezes em que eu quis morrer na escola. Ela jogou a folha sobre a minha mesa e me mandou refazer. De raiva, caprichei horrores, pesquisei. Ela corrigiu, me deu um B e mal olhou para minha cara.
Basicamente é isso. Se eu não virei a J.K. Rowling brasileira a culpa é exclusivamente da Priscila.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Tia Paula de férias (parte II)

Mãe: Você tomou o suco de laranja que eu comprei?
Tia Paula (no msn): Tomei.
Mãe: Gostou?
Tia Paula: Hum-hum.
Mãe: Quê?
Tia Paula: GOSTEI!
Mãe: Não precisa gritar, só perguntei.
Tia Paula: Tá.
Mãe: A carteirinha do seu plano de saúde continua em cima da cômoda.
Tia Paula: ...
Mãe: Eu já falei que você tem que andar com ela na bolsa, Paula.
Tia Paula: Tá.
Mãe: Pare de guardar suas roupas no avesso. É atraso de vida.
Tia Paula: Hum-hum
Mãe: Você usa essas camisetas? Posso dar para alguém?
Tia Paula: Eu uso pra correr, mãe.
Mãe: Mas você NUNCA vai correr.
Tia Paula: Agora que eu estou de férias eu vou.
Mãe: Então larga esse computador e vai.
Tia Paula: Tá frio.
Mãe: Quer uma banana?
Tia Paula: Não.
Mãe: Preciso de uma receita de torta de nozes, acha aí na internet pra mim?
Tia Paula: Daqui a pouco.
Mãe: Acho que eu vou comprar uma centrífuga.
Tia Paula: Pra quê?
Mãe: É mesmo, pra quê?
Tia Paula: ...
Mãe: Você viu meus óculos?
Tia Paula: Não.
Mãe: Leva o lixo lá fora pra mim?

E vocês achando que lidar com crianças demanda paciência...

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Querido Papai Noel,

Eu sei que eu não fui um menino bonzinho esse ano. Eu não fiz a lição de Matemática, não entreguei nenhum recado da professora para minha mãe e só tirei nota baixa em Inglês. Eu escondi a chave do meu armário dentro daquele vaso que tem ao lado da mesa da coordenadora e passei um mês sem fazer nada alegando que não tinha material. Eu bati nos moleques da segunda série (mas eles que pediram, Papai Noel! Cataram minhas figurinhas do Yugi-Ho e zoaram minha camisa do Corinthians). Eu chamei as meninas da minha sala de biscates e não aprendi que “xupa pal” se escreve com ch e com u. Eu rabisquei a parede da sala com canetinha, mostrei o dedo médio na foto da turma e cantei funk na aula de Ciências. Ah, e sabe o tênis do Juquinha da primeira série pendurado no ventilador? Fui eu, Papai Noel.
Mas, apesar de tudo isso, Papai Noel, eu queria ganhar um Play Station 3. Eu gastei um dinheirão de telefone lá em casa ligando pro SBT mas aqueles filhos da puta do Bom Dia e Cia nunca me atenderam e agora meu pai está querendo me matar. Você é minha última esperança. Eu sei que criança mal criada não ganha presente, mas eu queria te fazer uma proposta: o senhor me dá o Play Station e eu pago parcelado ano que vem, que tal? Eu começo já no primeiro dia do ano, não jogando minha tia Bete na piscina e não quebrando os brinquedos novos dos meus primos. E eu prometo que não vou fazer caricatura da professora gorda e espalhar para a escola (e veja bem, Papai Noel, eu passei o ano todo aperfeiçoando o desenho).
O que o senhor me diz, Papai Noel? Posso contar com meu Play Station 3? Caso o senhor não responda esta cartinha, tenho planos de contatar seus superiores lá no shopping (o senhor deve ter superiores lá, né? Ou o senhor é o dono do shopping?) e dizer para eles que o senhor cuspiu nas criancinhas.

Feliz Natal,

Matheus (o da 3ª A. O da 3ª B bateu na professora)

* Levemente inspirada na cartinha do colega de classe Tio Xavier.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Tia Paula precisa desabafar

Tem uma coisa que me irrita muito, mas muito mesmo em alunos de cursinhos de inglês. É quando aquele sujeito que já começou e parou o curso trocentas vezes e não consegue sair do intermediário olha para a minha cara e diz: "Eu odeio inglês, mas morro de vontade de aprender italiano."
a) Porque é sempre italiano? Qual o problema dessas pessoas com italiano? Deve ser resultado de anos de novelas do Benedito Ruy Barbosa na cabeça, né?
b) Queria muito ver neguim que não aprende nem do e does conjugando verbos em italiano.
c) Pra quê eles querem aprender italiano, afinal? Para pedir massa sem sotaque nas cantinas da 13 de Maio? Para assistir a RAI? Para ler Dante no original que não é.

Preciso dar umas dicas de marketing para o Círcolo Italiano. Eles deveriam distribuir panfletinhos em porta de escola de inglês.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Sabem o que eu descobri hoje?

Que os pais da Luiza são atores. Tá explicado.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Diálogo entre Tia Paula e seu coordenador

Tia Paula: Boss, tem neguinho que não conseguiu média na recuperação paralela, o que eu faço?
Boss: Passa no conselho.
Tia Paula: Posso?
Boss: Pode. Mas pode dar no máximo meio ponto. Se precisar de mais, recuperação final.
Tia Paula: Eu não posso vir ao conselho.
Boss: Eu passo pra você.
Tia Paula: Capricha, boss, que tô surtando. Se eu tiver que aparecer aqui semana que vem eu me mato.
Boss: Peraí (joga as notas na planilha). Pronto. Ó, esses aqui tão precisando de mais de meio ponto.
Tia Paula: Esses daí tão precisando de um cérebro novo, pô!
Boss: Corrige a prova deles de novo.
Tia Paula: Quê?
Boss: Não rola aumentar uns pontinhos? Faz uma correção mais camarada.
Tia Paula: Mas foi com muita boa vontade que eu considerei isso aqui como sendo inglês.
Boss: Certeza? Não dá mesmo?
Tia Paula: (pega a caneta, ameaça rabiscar alguma coisa na prova, desiste) Não dá, boss.
E é por isso que eu vim trabalhar hoje. Porque eu tenho escrúpulos. Quem mandou?

Sobre o post anterior

Agradeço os comentários e digo uma coisa: estou com medo de voltar à terceira série essa semana e encontrá-los com as carinhas pintadas empunhando lanças.